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- Assim mais assim, com os erros todos e muita demora, até há uns dois anos atrás eu ainda era homem para pôr algum bilhete no papel...
- Pois eu não. Nunca estive em escola, sentado não aprendi nada desta vida. Você sabe que eu não sei. Mas, cada ano que passa, eu vou ganhando mais dinheiro, comprando mais terras, pondo mais bois nas invernadas. Não sei fazer conta de tabuada, tenho até enjoo disso... Nunca assentei o que eu ganho ou o que eu gasto. O dinheiro passa como água no córrego, mas deixa poços cheios, nas beiras. Gosto de caminhar no escuro, João Manico, meu irmão!
- Em Deus estando ajudando, é bom, meu compadre seô Major.
- Também não tomo a reza dos outros, não desfaço na valia deles...
- De nenhum jeito, e eu posso ir junto!... Todo o mundo, aqui, trabalha sem arrocho... Só no falar de obedecer é que todos têm medo do senhor...
- Capaz que seja, Manicão? Será?
- Isso. Uns acham que é porque o seô Major espera boi bravo, a-pé, sem ter vara, só de chicote na mão e soprando no focinho do que vem...
- Mas eu gosto dos bois, Manico, ponho amor neles...
- A' pois. Eu sei, de mim que será por causa de nunca se ter certeza do que é que o meu compadre está pensando ou vai falar, que sai sempre o diverso do que a gente esperou... Só vejo que esse povo vaqueiro todo tem mais medo de um pito do senhor do que da chifrada de um garrote, comparando sem quebrar seu respeito, meu compadre seô Major.
- Escuta, Manico: é bom a gente ver tudo de longe. Assim como aqui nós dois vamos indo... Pelo rastro, no chão, a gente sabe de muita coisa que com a boiada vai acontecendo. Você também é bom rastreador, eu sei. Olha, o que eu entendo das pessoas, foi com o traquejo dos bois que eu aprendi...

( João Guimarães Rosa )
[ O Burrinho Pedrês ]
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